A Arte de Escrever (1)

“Espíritos de primeira categoria nunca se tornarão especialistas eruditos. Para eles, como tais, a totalidade da existência é que se impõe como problema, e é sobre ela que cada um deles comunicará à humanidade novas soluções, de uma forma ou de outra. Pois só pode merecer o nome de gênio alguém que assume como o tema de suas realizações a totalidade, aquilo que é grandioso, as coisas essenciais e gerais, e não alguém que dedica os esforços de sua vida a esclarecer qualquer relação específica de objetos entre si.
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Assim, o produto espiritual de quem pensa por si mesmo é semelhante a um belo quadro, cheio de vida, com luzes e sombras precisas, uma tonalidade bem definida e uma perfeita harmonia das cores. Em contrapartida, o produto espiritual do erudito é como uma grande paleta cheia de tintas coloridas, dispostas de maneira ordenada, mas sem harmonia, coesão e significado.
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O sinal característico dos espíritos de primeiro nível é a espontaneidade de seus juízos. Tudo o que vem deles é resultado de seu pensamento mais próprio e se mostra como tal já na sua maneira de se expressar. Eles possuem, como os príncipes, um poder de atuação imediata no reino dos espíritos, enquanto os outros são todos mediatizados, o que pode ser notado em seu estilo, que não tem um cunho próprio. Assim, todo pensador autêntico assemelha-se a um monarca: ele atua diretamente e não reconhece ninguém acima de si. Seus juízos, como as decisões de um monarca, são provenientes de seu poder supremo e não contêm qualquer mediação. Pois, assim como o monarca não aceita ordens, ele não aceita nenhuma autoridade, de modo que só é válido o que ele mesmo comprovou.”


Arthur Schopenhauer, in: A arte de escrever